Como o Terroir afeta a qualidade do café especial?

No Brasil, assim como em várias regiões produtivas ao redor do globo, terroirs distintos refletem identidade e excelência na xícara.

O terroir consiste na combinação do solo, clima, altitude, temperatura, variedade da planta e práticas agrícolas, influenciando diretamente o perfil sensorial do café. Um manejo adequado, colheita no tempo certo, o beneficiamento do café e armazenamento irão contribuir para fechar o ciclo daquele café no terroir.

A Specialty Coffee Association (SCA) destaca o terroir como o conjunto de fatores ambientais e humanos que criam as características únicas de cada café, sendo fundamental para a qualidade reconhecida internacionalmente. A associação promove pesquisas e padrões que reforçam a importância do solo, clima e altitude para diferenciar cafés no mercado global. 

Aqui temos algumas dicas de leitura:

  • O livro “Terroir”, publicado por educadores da Barista Hustle, mapeia como especialistas e cientistas interpretam o terroir, incluindo entrevistas com produtores e acadêmicos. Nele, é explicado que terroir vai além do solo e clima, incluindo o manejo agrícola e microbioma presente, que também afetam aroma e sabor.
  • James Hoffmann, em seu livro “The World Atlas of Coffee”, analisa como as condições ambientais — altitude, tipo de solo e regime climático — moldam a complexidade do café, impactando desde açúcares naturais até perfis aromáticos, importantes para avaliação sensorial e competitividade do produto final.
  • O barista e produtor Tim Wendelboe reforça em entrevistas que o terroir deve ser considerado como uma cadeia integrada, desde a seleção da variedade até os cuidados no cultivo, para obter cafés com acidez brilhante, corpo equilibrado e aromas que destacam a origem.

Pesquisas científicas recentes, inclusive patrocinadas por empresas como a Illycaffè, evidenciam a relação entre o microbioma do solo de cultivo e as características sensoriais da bebida, indicando que o terroir é um elemento vivo e muito complexo, cuja biodiversidade local impacta diretamente a singularidade na xícara.

 

Altitude em Cafés Arábicas?

Cafés de altitudes elevadas tendem a amadurecer mais lentamente devido a variação climática ao longo do dia, onde temos uma temperatura média ao longo do ano propícia pro cafeeiro se desenvolver que gira em torno de 19 a 23ºC. A Altitude acaba sendo relacionada também a sua proximidade a linha do equador. Regiões produtoras que estão mais próximas a linha do equador precisam plantar os cafés (arábica) em regiões mais elevadas para que o cafeeiro cresça dentro dessa temperatura média ideal, e conforme vamos nos afastando do equador a altitude pode ser mais baixa. O clima com manhãs e noites mais frias, e o período da tarde com o calor mais elevado, ajudam a desenvolver a complexidade nos frutos, amadurecimento mais lento, trazendo por exemplo uma acidez mais rica e pronunciada, aromas florais e sabores complexos. Se você já tomou um café do Paraná (+800m), Cerrado Mineiro (+950m), um do Alto do Caparaó (+1200m) ou mesmo um café da Etiópia (+2000m), já deve ter percebido como são bem diferentes em sua complexidade. Cada um com seu Terroir específico e altitudes diferentes, justamente pela sua relação com a linha do equador.

Em regiões mais baixas, os grãos podem apresentam um perfil um pouco mais simples pelo amadurecimento mais rápido, já que a variação climática é um pouco menor e as temperaturas tendem a ser mais elevadas não sendo propício pra maturação mais lenta dos frutos no café arábica. 

Notaram que usamos bastante as palavras “tendem a ser…“?
Digo isso porque conforme você trabalha e exeprimenta café, vai entendendo que é tudo muito delicado e que não existem regras absolutas. O café é complexo e temos diversos fatores que impactam sua qualidade. Já provamos ótimos cafés vindo de regiões mais baixas, assim como já experimentamos cafés da Etiópia que eram frutados mas sem uma grande complexidade. 

Aqui no Brasil, duas regiões que gostamos muito: Alto do Caparaó (ES) e a Serra da Mantiqueira (MG).

 

Principais terroirs reconhecidos no Brasil

O café é o produto agrícola brasileiro com o maior número de registro de Indicações Geográficas (IG) no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI). O Brasil possui diversas regiões cafeeiras com reconhecimento de Indicação Geográfica (IG) e Denominação de Origem (DO), cada uma representando perfis sensoriais e tradições distintas. A principal diferença é que IG (Indicação Geográfica) é um selo que certifica um produto com reputação e características únicas de uma região, enquanto DO (Denominação de Origem) é uma modalidade de IG que exige a comprovação científica da influência do meio ambiente (solo, clima, etc.) nas qualidades do café. A DO é um reconhecimento mais rigoroso e demorado que a outra modalidade de IG, a Indicação de Procedência (IP).

A primeira região produtora de café reconhecida foi a Região do Cerrado Mineiro, sendo a segunda IG brasileira, com o registro de Indicação de Procedência concedido pelo INPI em abril de 2005. Em 2011 foi a vez da Região da Serra da Mantiqueira, também em Minas Gerais, seguida pelo Norte Pioneiro do Paraná (2012), Alta Mogiana – SP (2013), Região do Pinhal – SP (2016), Oeste da Bahia – BA (2019), Campo das Vertentes e Região das Matas de Minas – MG, ambas em 2020. Ainda temos mais recentemente o Caparaó 
 

Qual a diferença de Indicação geográfica e Denominação de Origem?

 
 
Indicação Geográfica (IG)
Denominação de Origem (DO)
Definição
Um selo que protege produtos vinculados a um território, garantindo sua origem, qualidade e reputação.
Uma categoria mais restrita de IG que comprova a influência de fatores geográficos (solo, clima, altitude) nas qualidades únicas do café.
Exigências
Requer a comprovação de que o produto tem notoriedade e reputação por ser de uma região específica.
Exige comprovação científica da influência do meio ambiente (terroir) nas qualidades do produto.
Processo
É um processo mais rápido, exigindo a delimitação geográfica e o reconhecimento da reputação.
É um processo mais demorado e complexo, que envolve análises científicas detalhadas e envio de amostras.
Reconhecimento
Certifica a origem e a qualidade, mas a influência ambiental não precisa ser cientificamente comprovada.
Além da reputação, certifica a qualidade e a tipicidade do produto, comprovando que suas características são intrinsecamente ligadas ao local.
Exemplos
O Café da Serra da Mantiqueira (inicialmente IP) e o Norte Pioneiro do Paraná são exemplos de IGs.
O Cerrado Mineiro e a Mantiqueira de Minas tiveram seus registros de IP alterados para Denominação de Origem.

 

Cerrado Mineiro (MG): Primeira DO reconhecida no país; clima seco durante a colheita, altitudes de 800 a 1.300 metros, cafés encorpados, adocicados e com notas de caramelo e nozes (nosso Doçura e Laranjinha!)

Sul de Minas (MG): Maior produtor nacional; altitudes entre 800 e 1.400 metros, clima ameno, cafés com acidez brilhante, corpo médio/alto e perfis frutados.

Mogiana (SP): Interior paulista; solo fértil, altitude entre 900 e 1.100 metros, cafés aromáticos, acidez moderada e corpo equilibrado.

Chapada Diamantina (BA): Altitude elevada, clima seco e temperatura ideal; cafés adocicados, corpo aveludado, acidez cítrica e notas de chocolate ou nozes.

Matas de Minas (MG): Região de Mata Atlântica, produção artesanal com muitos pequenos produtores, cafés complexos, acidez e doçura evidentes.

Espírito Santo (Montanhas do ES e Caparaó): Clima montanhoso, excelente para arábicas com alta acidez, perfumes florais e sabores diferenciados.

Norte do Paraná: Conhecido como “Terra Vermelha”, cafés com corpo aveludado e aromas intensos.

 

Região IG/DO Altitude (m) Perfil Sensorial
Cerrado Mineiro DO 800–1.300 Encorpado, adocicado, caramelo/nozes
Sul de Minas IG 800–1.400 Frutado, doce, acidez brilhante, corpo médio
Mogiana IG 900–1.100 Aromático, acidez moderada, equilibrado
Chapada Diamantina IG >850 Doçura elevada, cítrico, final prolongado
Matas de Minas IG 400–1.200 Complexo, acidez/doçura evidentes
Caparaó/ES/MG IG 900–1.200 Floral, frutado, acidez complexa, aromático
Paraná Corpo aveludado, aroma intenso

 

Essas regiões carregam identidades singulares, e cafés de cada uma expressam de forma marcante as nuances do terroir brasileiro — desde a doçura dos cerrados até a complexidade e frutado do Alto do Caparaó.

A compreensão e valorização do terroir são fundamentais para destacar e diferenciar cafés na cadeia especial nacional e global, construindo reputação e expandindo horizontes para produtores e marcas brasileiras.  

Ao escolher cafés de origem controlada, apreciadores e cafeterias investem em qualidade e autenticidade — resultando em experiências cada vez mais únicas e memoráveis na xícara.

 

Referências utilizadas
– Perfect Daily Grind Brasil  
– Cooxupé  
– Specialty Coffee Association (SCA)  
– Barista Hustle (Livro Terroir)  
– James Hoffmann (“The World Atlas of Coffee”)  
– Tim Wendelboe
– Pesquisas Illycaffè sobre microbioma do solo 
– Gov.Br
– Embrapa 

 

 

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